09 setembro 2011

A LEITURA DA BÍBLIA AO LONGO DOS SÉCULOS - "A LEITURA DA BÍBLIA FEITA PELOS ESCRIBAS NO TEMPO DE JESUS"





A LEITURA DA BÍBLIA FEITA PELOS ESCRIBAS NO TEMPO DE JESUS


            O primeiro e grande conflito que aconteceu, diz respeito a uma determinada corrente fanática, pois no tempo de Jesus havia um movimento de judeus que fazia referência a memória dos profetas e dos acontecimentos do passado, eram os pobres de YHWH. Mas as relações entre tal grupo e a linha mais dura do Judaísmo não eram nada amigáveis. Nesta época havia muitas sinagogas e os escribas e mestres da lei eram responsáveis pela leitura e a explicação das Escrituras. Os escribas não só ensinavam as escrituras, mas também as copiavam. Eles tinham grande reverência pelos textos do Antigo Testamento, mas essa veneração logo caiu no exagero (Zuch, 1994, p. 32). 
            Vale lembrar que o lugar preferido para a leitura da Torá e dos profetas eram as sinagogas. Com relação a Torá:

A primeira leitura, a da Torá, é de inspiração mosaica: sabemos, aliás, que houve na instituição e organização dessa leitura diversas etapas e Esdras é mencionado por representar uma dessas etapas, uma das mais importantes. A leitura dos profetas, igualmente imemorial, é atestada como incontestável tanto na literatura rabínica como no Novo Testamento (Lc 4, 16-20) (Collin, 1994, p. 21).

Durante o culto a Torá e os profetas eram lidos em hebraico, considerada língua Sagrada. O povo da roça não entendia muito o hebraico, pois falava aramaico e os Judeus da diáspora só sabiam grego ou latim. Na Galileia, depois de cada versículo em hebraico traduzia-se em aramaico, era uma tradução-comentário chamada Targúm, em seguida havia a leitura do Midrash, que era o momento da atualização, em aramaico, das Sagradas Escrituras, e a lei, que originariamente eram os dez mandamentos que foram ampliados em 613 normas, sendo 365 proibições, 248 obrigações e 40 leis sobre o sábado (Mosconi, 2002, p. 40).
Ao longo dos tempos aconteceu a tradução da Torá e dos profetas, a já citada, chamada Targum. Esta é a Escritura traduzida, versículo por versículo, para o grego nas sinagogas do Egito, para o aramaico na Palestina, Síria e Mesopotâmia. Dois membros da comunidade dividiam os papéis um lendo e o outro traduzindo. O Targum grego passou a ser escrito a partir de 300 a.E.C e tomou o nome de Setenta, em conseqüência de uma lenda que o fazia passar por obra de 70 escribas. A obra dos Setenta desenvolveu-se entre os prosélitos da Diáspora que falavam o grego.
            A escritura tornou-se mera lei absoluta e deixou de ser fonte geradora, passando a ser um peso, a lei estava acima da vida. Ao invés de lutar pela vida só se falava em obedecer e observar as leis. Jesus faz a releitura disso com sua vida pública, Jesus foi muito duro com essa interpretação das Escrituras: “se a justiça de vocês não superar a dos doutores da lei e dos fariseus, não entrarão no reino do céu” (Mt 5,20) (Mosconi, 2002, p.40).
Ainda hoje muitos lêem a Bíblia como um livro de imposições meramente legalistas, do tipo pode / não pode, e se esquecem de ver que a Palavra de Deus é viva e eficaz, basta que saibamos utilizá-la como instrumento deixado por Deus para a edificação do gênero humano!
A Igreja sempre se mostrou preocupada com a interpretação da Bíblia, já no ano de 1993, a Pontifícia Comissão Bíblia, lançou um documento intitulado “A interpretação da Bíblia na Igreja”, o qual já demonstrou a importância de tal assunto que foi problema no passado e também em nossos dias, um documento muito rico e que nos ajuda a refletir.
Para ajudar na interpretação da Bíblia vale aqui transcrever um artigo da Constituição Dogmática Dei Verbum:

Como, porém, Deus na Sagrada Escritura falou por meio dos homens e à maneira humana, o intérprete da Sagrada Escritura, para saber o que Ele quis comunicar-nos, deve investigar com atenção o que os hagiógrafos realmente quiseram significar e que aprouve a Deus manifestar por meio das suas palavras.
Para descobrir a intenção dos hagiógrafos, devem ser tidos também em conta, entre outras coisas, os “gêneros literários”. Com efeito, a verdade é proposta e expressa de modos diversos, segundo se trata de gêneros histéricos, proféticos, poéticos ou outros. Importa, além disso, que o intérprete busque o sentido que o hagiógrafo em determinadas circunstâncias, segundo as condições do seu tempo e da sua cultura, pretendeu exprimir e de fato exprimiu servindo se os gêneros literários então usados. Com efeito, para entender retamente o que autor sagrado quis afirmar, deve atender-se convenientemente, quer aos modos nativos de sentir, dizer ou narrar em uso nos tempos do hagiógrafo, quer àqueles que costumavam empregar-se freqüentemente nas relações entre os homens de então.
Mas, como a Sagrada Escritura deve ser lida e interpretada com o mesmo espírito com que foi escrita, não menos atenção se deve dar, na investigação do reto sentido dos textos sagrados, ao contexto e à unidade de toda a Escritura, tendo em conta a Tradição viva de toda a Igreja e a analogia da fé. Cabe aos exegetas trabalhar, de harmonia com estas regras, por entender e expor mais profundamente o sentido da Escritura, para que, mercê deste estudo de algum modo preparatório, amadureça o juízo da Igreja. Com efeito, tudo quanto diz respeito à interpretação da Escritura, está sujeito ao juízo último da Igreja, que tem o divino mandato e o ministério de guardar e interpretar a palavra de Deus (DV 12).

O Sínodo da Palavra em seu número 16 alerta também para a questão da interpretação da Palavra de Deus:

A visão de tantos cristãos que, em comunidade ou individualmente, perscrutam de forma muito tão intensa a Palavra de Deus no Livro Sagrado, é para a Igreja uma preciosa possibilidade de habilitar os fiéis a uma sua correta compreensão e actualização. De certo modo, isso mais se impõe hoje, que se abre um novo confronto entre a Palavra de Deus e as ciências do homem, nomeadamente no âmbito da investigação filosófica, científica e histórica. Reconhece-se a riqueza em termos de verdade e de valores sobre Deus, o homem e as coisas, que provém desse contacto entre Palavra e cultura, como também se propõe um constante confronto sobre problemas inéditos. A razão, portanto, interpela a fé e é por esta instigada a colaborar para uma verdade e vida que sejam conformes à revelação de Deus e às expectativas da humanidade.
Não faltam, porém, também os riscos de uma interpretação arbitrária e redutiva, como é o fundamentalismo: por um lado, pode manifestar o desejo de ser fiéis ao texto, mas, por outro, despreza a própria natureza dos textos, caindo em graves erros e gerando mesmo conflitos inúteis. Outros riscos provêm das leituras “ideológicas” ou simplesmente humanas, sem o suporte da fé (cf. 2Pe 1,19-20; 3,16), que chegam a configurar-se na contraposição e separação entre forma escrita atestada antes de mais na Bíblia, forma viva do anúncio e experiência de vida dos crentes. Torna-se igualmente difícil reconhecer o papel que cabe ao Magistério no serviço da Palavra de Deus, tanto em relação à Bíblia como à Tradição. Em geral, nota-se um fraco ou impreciso conhecimento das regras hermenêuticas relativas à identidade da Palavra, feitas de critérios humanos e revelados, no contexto da Tradição eclesial e em obséquio ao Magistério.

 
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